segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

França: Para a direita é mais fácil transmitir medos do que ideias

Por Maria Quitéria Turcios*
A candidata às eleições presidenciais de 2012 na França, Marine Le Pen, da Frente Nacional (FN), partido mais à direita no espectro político francês, está se revelando cada vez mais odiosa e mais perigosa que seu papai, Jean Marie Le Pen.


O tom da campanha de Marine é preconceituoso, em todos os sentidos possíveis do termo. Para se ter uma ideia de como seu programa é conservador, a candidata diz que tem que haver uma escala de penas para os crimes e a pena de morte é uma dessas escalas, mostrando que é a favor dessa prática de barbárie.

Em um dos pontos que diz respeito aos movimentos sociais, Marine Le Pen diz que em universidades e escolas do ensino médio deve haver portões com detector de metais e os alunos devem ser revistados. Tudo isso para controlar e sufocar o movimento estudantil. Na foto de campanha da FN, podemos ver que há dois lados opostos e uma frase abaixo: “Choisis ta France” (escolha sua França), apresentando duas visões do país.


Do lado esquerdo, há a figura de um jovem aparentemente mal vestido, com um boné sujo e velho. O rapaz está sentado no banco e com o rosto escondido, lê um jornal. O que será que está lendo? Vendo ao seu lado, uma mala velha e seu par de tênis pendurado, podemos concluir que o jovem não está lendo sobre a cotação do euro e muito menos sobre seu signo na parte do horóscopo semanal. Provavelmente, ele é algum imigrante em busca de emprego na França. 

Atrás do jovem, vemos uma cena apocalíptica, com muito fogo, um carro capotado em chamas e pessoas em volta, como se estivessem protestando. Essa cena é para fazer alusão à revolta dos jovens da periferia francesa em 2005, ocasião em que queimaram carros, através da violência urbana, decorrente da indignação por não terem oportunidade de se integrarem à sociedade francesa e por sofrerem uma discriminação sem precedentes. Esses jovens são, em sua maioria, franceses originários do norte da África, a região conhecida como Magreb. 

Sentados no mesmo banco, porém, ao lado direito, encontra-se um casal apaixonado, curtindo a paisagem linda de uma cidade campestre. O lado esquerdo representa o mal, o inferno (representado pelo fogo), o diabo, os cruéis, a sujeira, a pobreza, ou seja, os imigrantes, estrangeiros, negros, muçulmanos e os baderneiros de esquerda. O lado direito é o lado do bem, dos bons, da ordem, de deus e da limpeza, representados pelo casal branco e jovem. 

O desemprego em massa, a pobreza, falta de oportunidades e a perda de direitos sociais dos trabalhadores são fatos inerentes à própria natureza selvagem do capitalismo, que agora tem na União Europeia o epicentro de sua crise. Sobre tal terreno social, muitos europeus e principalmente os trabalhadores estão vivendo em um mundo de frustrações, medo e incertezas.

Nessa conjuntura, a FN evoca em seus discursos a ideologia do protecionismo e da defesa às minorias, dá a entender que quer resolver os problemas cotidianos das classes populares e fala de coisas que estas conhecem bem. Entretanto, seu programa é extremamente xenofóbico, reacionário e demagógico. Como toda direita, o partido de Madame Le Pen quer mostrar que o capitalismo é invencível e usando de argumentos preconceituosos, projeta nos muçulmanos, ciganos, estrangeiros, imigrantes e principalmente nos povos árabes, a consequência da França estar “mal das pernas”.

Esse partido da direita descarada quer fazer uma lavagem cerebral na cabeça dos franceses, mostrando que essas minorias causam badernas, promovem a crise, que são uma concorrência no mercado de trabalho e que, com Marine Le Pen na presidência, o princípio seria o da preferência nacional, ou seja, os postos de trabalho para o povo francês, sem apresentar concorrência dos intrusos.

Tanto para o fundador da FN, seu pai Jean-Marie Le Pen, quanto para a filha, les enfants de la patrie, as crianças da pátria francesa não são todas francesas e isso é um problema, pois para este partido de extrema-direita, a nação não deve ser um país de destino dos imigrantes, mas deve ser restaurada em um sentido étnico do termo, mostrando uma xenofobia carregada de preconceitos.

Um dos objetivos da análise do discurso, campo ligado à linguística, é analisar as construções ideológicas presentes no texto, seja pelo escrito ou pelo não verbal, através de imagens, figuras e desenhos. Nessa imagem, o discurso do não verbal, simbolizado pela divisão do banco e pelos dois lados antagônicos, mostra a essência da extrema-direita: a separação, oposição, o distanciamento e a não integração. É por isso que os franceses não podem baixar a guarda e devem combater a Frente Nacional, em todas as frentes. 

*Maria Quitéria Turcios é mestranda em Linguística pela Université d´Avignon et des Pays de Vaucluse, França. 

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