Por Marcelo Pellegrini, na Carta Capital
Em época de ajuste fiscal e desaceleração econômica, parece não haver uma solução simples para sair da crise no curto prazo. Para o governo, a aposta para a retomada é a infraestrutura, como ficou claro no lançamento do Programa de Investimentos em Logística(PIL). Presente no evento Diálogos Capitais: Infraestrutura, promovido por CartaCapitalnesta segunda-feira 15, em São Paulo, o ministro da Secretaria de Portos, Edinho Araújo, detalhou como o governo quer transformar deficiências históricas brasileiras em soluções.
"O Brasil possui gargalos de infraestrutura que dificultam a atividade econômica. Ao investir na solução desses problemas, melhoramos nossa competitividade no longo prazo e movimentamos a economia com obras", disse o ministro. Para tanto, o PIL, anunciado na terça-feira 9, é peça-chave.
Essas obras precisam ter foco, avaliam autoridades e especialistas presentes no evento. Atualmente, o Brasil possui uma grande desigualdade regional de infraestrutura, cujos reflexos são o encarecimento dos produtos e a redução da competitividade brasileira no cenário internacional. A situação do agronegócio, principal motor do PIB nos últimos tempos, deixa isso claro.
Nos últimos 50 anos, o agronegócio expandiu sua fronteira agrícola em direção ao norte do País, que é carente de infraestrutura. Por isso, os custos do transporte entre o local de produção e os portos no Sul e Sudeste subiram. "No Brasil, gasta-se quatro vezes mais no transporte de produtos do que os Estados Unidos e Argentina", afirma Luiz Antônio Fayet, consultor em logística da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). “Poderíamos nos destacar mais se houvesse o investimento regional correto, em vez de jogar esse dinheiro no ralo insistindo em transportar tudo por caminhões”, completa.
Estimativas indicam que o problema só tende a crescer se o diálogo entre governo e iniciativa privada não se fortalecer. Segundo as projeções da CNA, até 2020 o Brasil deve superar as exportações de alimentos dos Estados Unidos e assumir a liderança global do agronegócio. No entanto, para que isso aconteça, alguns entraves devem ser solucionados. "Por incapacidade de arcar com os custos de transporte, o Brasil deixou de produzir 4 milhões de toneladas de soja e milho em 2014", afirma Fayet. "Ao gastar bilhões com transporte, deixamos de reinvestir esse dinheiro em produção e na economia interna". Hoje, 90% dos custos envolvidos na produção de soja são pagos a outras empresas brasileiras.
Para Fayet, a solução passa primeiro pelo investimento na distribuição da infraestrutura pelo território nacional. "É preciso melhorar o escoamento regional dos produtos. O Brasil só tem a crescer, mas precisa fazer modificações em sua matriz de transportes", defende.
O discurso do dirigente da CNA parece alinhado com os projetos do governo, a julgar pelas características iniciais do Programa de Investimentos em Logística. Os projetos de ferrovias incluídos no PIL somam 86,4 bilhões de reais, mais do que rodovias (66,1 bilhões de reais), portos (37,4 bilhões) e aeroportos (8,5 bilhões). Apresentado por Dilma Rousseff como "grande aposta para o crescimento do país", o PIL é um contraponto ao criticado ajuste fiscal. "O ajuste fiscal não é meta de governo, mas um caminho. Após termos um maior equilíbrio nas contas, podemos reorganizar os investimentos para áreas que temos deficiências e que trazem maior competitividade para nossa economia", afirma o ministro Edinho Araújo.
Fortalecimento da indústria
O sucesso do programa, no entanto, não depende apenas da melhoria logística do País, disse durante o evento o diretor do Instituto de Economia da Unicamp, Fernando Sarti. "O programa é uma oportunidade única de promover investimento alavancando a indústria e a eficiência produtiva", afirma. No entanto, é preciso assegurar que as obras tenham forte conteúdo nacional. "Não adianta acelerar os gastos com infraestrutura se isso significar demanda para coreanos e chineses", pontua Sarti.
Nos últimos anos, o Brasil passa por um momento de enfraquecimento de sua indústria. Apenas em 2014, o setor encolheu 3,2% e a tendência é que resultado similar se concretize este ano. Para alterar esse cenário, o diretor da Unicamp defende um aumento dos investimentos federais. "Os 198 bilhões de reais são um bom aceno, mas são insuficientes. Nosso gasto deveria estar na ordem de 240 bilhões de reais se nos compararmos com os demais Brics [grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul]", afirma. Segundo ele, o crescimento chinês está apoiado em investimentos de infraestrutura, com produção industrial nacional, que são quatro vezes maiores que os aportes brasileiros.
Não é somente para os Brics que o Brasil perde em investimentos de infraestrutura. "Os atuais 2% do PIB voltados para o setor no Brasil estão abaixo dos 3,6% de investimentos em relação ao PIB no resto do mundo", diz Sarti. Para ele, o Brasil deve aproveitar o bom momento econômico do agronegócio para aumentar o investimento em infraestrutura dos atuais 13% para 20%. "Com isso, aumentamos a integração regional, diminuímos desigualdades, fortalecemos a indústria, geramos tecnologia, renda e emprego e ainda resolvemos um problema histórico brasileiro".
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